Posse do novo presidente do TSE torna ainda mais difícil para Bolsonaro sustentar uma ruptura democrática, diz professor Rogério Dultra dos Santos. Lula afirma que cerimônia causou ‘desconforto’ em Bolsonaro
São Paulo – Para o professor da Faculdade de Direito da Universidade Federal Fluminense (UFF) Rogério Dultra dos Santos, membro da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD), o discurso de posse do ministro Alexandre de Moraes, como novo presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), “foi muito desgastante” para o presidente Jair Bolsonaro (PL). Na avaliação do jurista, os fortes aplausos recebidos por Moraes das autoridades do campo político e jurídico, diante de sua fala contra as fake news, mostram que todos estão em defesa da democracia.
O que torna ainda mais difícil para Bolsonaro sustentar uma ruptura democrática, como vem ameaçando caso perca as eleições em outubro. O também ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) assumiu o cargo no lugar do ministro Edson Fachin, que, em pronunciamento na noite de ontem (16) durante a cerimônia, também exaltou a democracia e a importância das instituições eleitorais.
Fachin terminou sua fala com um abraço em Moraes, simbolizando, de acordo com Santos, o apoio do STF à figura de seu ministro. Por sua vez, diante de Bolsonaro e da plateia que contava ainda com outros quatro ex-presidentes, o novo presidente do TSE enfatizou a defesa do voto como instrumento da democracia, chamando o sistema anterior de votação de “nefasto”, conforme reportou a RBA. O ministro ainda rechaçou a propagação de discursos de ódio, preconceituosos ou contra o Estado democrático de direito. E reiterou que “liberdade de expressão não é liberdade de agressão”.
Carta aos brasileiros 2.0
O discurso, para o jurista, referendou também a “Carta aos brasileiros”, manifesto de 1977, reeditado em defesa da democracia e divulgado no último 11. O documento foi articulado por vários segmentos da sociedade civil, chegou a ser assinado por mais de 1 milhão de brasileiros, e uniu forças políticas e econômicas no que foi considerada também uma resposta à escalada golpista de Bolsonaro.
“E isso representa um movimento importante não só de apoio às eleições e à democracia, mas importante de desarticulação de qualquer tipo de força que Bolsonaro pudesse ter em relação a essas forças políticas e econômicas”, explica Santos.
“O discurso de Alexandre de Moraes foi muito importante, porque ele foi muito duro e passou vários recados ao Bolsonaro e sua família. (…) O ministro fez uma defesa bastante forte da democracia como o único regime político em que o poder emana do povo. Então, a gente tem ali uma situação que foi muito desgastante para Bolsonaro. Alexandre de Moraes foi muito aplaudido. Estamos em uma nova rota de reconstrução institucional. Eu considero que a posição do STF e do TSE foi consolidada ontem e referendada por todas as forças políticas que estavam presentes na cerimônia”, acrescenta o jurista.
Desconforto visível, diz Lula
Em entrevista na manhã desta quarta (17) à Rádio Super, de Minas Gerais, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que participou da posse de Moraes e é um dos candidatos ao Palácio do Planalto, afirmou que Bolsonaro “estava muito incomodado” na cerimônia. “Ouviu tantas vezes a palavra democracia e críticas às mentiras. Era visível o desconforto”, descreveu Lula. Ao dizer que compreendia a postura do atual presidente, o petista aproveitou para criticá-lo. “Ele não gosta de democracia, e ontem foi um ato em defesa do Estado democrático no Brasil”, ironizou Lula.
A expectativa, contudo, é que o discurso de posse seja realizado na prática para garantir a segurança do processo eleitoral. De acordo com o professor e integrante da ABJD, o novo presidente do TSE tem “as rédeas de uma estrutura repressiva muito importante durante as eleições”. “Esperamos que as instituições funcionem como ontem ficou patente o interesse de que isso aconteça”, advertiu Dultra. (RBA) Foto: Reprodução