Contrato de trabalho intermitente, introduzido pela Lei no 13.467/2017, tem sido objeto de intenso debate no Brasil. O estudo publicado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) no dia 4 de agsoto, mostra como mostra que há uma série de elementos que precisam ser considerados na discussão, incluindo a caracterização dos trabalhadores com esse tipo de vínculo, a comparação com outras modalidades de trabalho, a evolução recente da contratação intermitente no mercado de trabalho brasileiro e a qualificação dos trabalhadores nessa modalidade.
O contrato de trabalho intermitente é definido como um vínculo no qual a prestação de serviços ocorre de forma não contínua, alternando períodos de atividade e inatividade. Esse contrato deve ser celebrado por escrito e especificar o valor da hora de trabalho, que não pode ser inferior ao valor horário do salário mínimo. O empregador deve convocar o trabalhador com antecedência mínima de três dias, e a recusa da oferta não descaracteriza a subordinação. O trabalhador intermitente tem direito a receber imediatamente o pagamento pelos serviços prestados, assim como parcelas proporcionais de férias, décimo terceiro e repouso semanal remunerado.
A constitucionalidade do modelo sido é objeto de questionamentos no Supremo Tribunal Federal (STF) através de Ações Diretas de Inconstitucionalidade (Adin). A tese é que essa forma de contrato precarizaria o trabalho e violaria direitos fundamentais dos trabalhadores. O julgamento dessas Adin ainda está em curso. No entanto, a legislação brasileira já prevê proteção aos trabalhadores intermitentes e estabelece direitos e obrigações para ambas as partes.
A contratação de trabalho intermitente não é exclusiva do Brasil e está presente em países como França, Reino Unido, Itália, Espanha, Portugal, Alemanha e Estados Unidos. Esses contratos surgiram como resposta às transformações do trabalho, como a ascensão do setor de serviços, desenvolvimentos tecnológicos e mudanças nas estratégias organizacionais das empresas. Existe, portanto, uma tendência internacional de reconhecer essa modalidade de trabalho e o Brasil tem seguido essa atualização.
Uma questão relevante no debate é a qualificação dos trabalhadores nessa modalidade. Para avaliar a questão o estudo utiliza o Quadro Brasileiro de Qualificações (QBQ), lançado pelo Ministério do Trabalho e Previdência. O painel permite comparar as competências, habilidades e atitudes dos trabalhadores intermitentes com os de outras modalidades de trabalho. Esses profissionais não apresentam diferenças significativas em termos de qualificação média em relação aos demais trabalhadores formais, mesmo quando a análise é desagregada em conhecimentos, habilidades e atitudes. O que indica que não há evidências de precarização do trabalho com a modalidade intermitente, ao menos no que diz respeito à qualificação.
De acordo com os dados da Relação Anual de Informações Sociais (Rais), a participação dos trabalhadores intermitentes no mercado de trabalho brasileiro é inferior a 1% do estoque de vínculos, sejam eles celetistas ou totais. Apesar de estar em crescimento, a participação tem aumentado apenas entre 0,1 e 0,2 ponto percentual a cada ano. Esses números indicam que é precipitado afirmar que o contrato intermitente ameaça outras formas de contratação, considerando sua participação ainda relativamente pequena. No Reino Unido, onde os Contratos Zero-Hora (CZHs) era de cerca de 2,9% da população ocupada em 2016, aproximadamente 903 mil trabalhadores. No Brasil, com quase 100 milhões de trabalhadores ocupados em 2022, a participação dos intermitentes seria ainda menor e longe de alcançar os níveis de outros países.
Outra metodologia utilizada pela publicação é a análise do Novo Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), que confirma a pequena participação dos trabalhadores intermitentes no saldo mensal de contratações formais no país. Entre janeiro de 2020 e setembro de 2022, a média mensal de contratações intermitentes foi de apenas 6,8 mil trabalhadores, enquanto as outras modalidades de contratação geraram cerca de 137 mil postos de trabalho. No ano de 2022, os intermitentes representaram em média 2,8% do total de empregos formais criados.
Apesar de pequena participação, esses trabalhadores têm apresentado um volume maior de admissões e desligamentos em 2022, em comparação com anos anteriores. Em termos de saldo, houve estabilidade entre 6 e 7 mil postos líquidos em 2022. No entanto, nos anos anteriores, houve oscilações mais intensas, influenciadas pela pandemia de Covid-19. Ao contrário de outras modalidades, os intermitentes tiveram apenas um mês com resultados negativos, em abril de 2020, quando a atividade econômica estava fortemente impactada pelas restrições da pandemia.
A modalidade de contrato intermitente permite uma flexibilidade que outras modalidades não alcançam. Isso ocorre porque a própria atividade econômica apresenta períodos de atividade e inatividade. Durante a pandemia, essa flexibilidade permitiu que pessoas com este vínculo mantivessem seus postos de trabalho, mesmo com oscilações na demanda. Não há evidências de que o contrato intermitente tenha ameaçado o saldo positivo de empregos formais.
Com base nas informações analisadas, o texto conclui que o contrato de trabalho intermitente no Brasil ainda possui uma participação relativamente baixa no mercado de trabalho. Não há evidências de que essa modalidade ameace outras formas de contratação, e os números indicam que o crescimento dos trabalhadores intermitentes tem sido gradual. A qualificação média desses trabalhadores é similar à dos demais trabalhadores formais, o que refuta a ideia de precarização do trabalho.
Fonte: ipea.gov.br